Desenvolvimento e aplicação de nova metodologia de perfis de vento offshore

Luiz Felipe Rodrigues do Carmo

l.docarmo.meteoroufrj@gmail.com

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Ana Cristina Pinto de Almeida Palmeira

anapalmeira@igeo.ufrj.br

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Wellington Ceccopieri Belo

wceccopieri@petrobras.com.br

Centro de Pesquisas, Desenvolvimento e Inovação Leopoldo Américo Miguez de Mello - CENPES/PETROBRAS, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Luis Manoel Paiva Nunes

luismanoelpaiva@gmail.com

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.


RESUMO

O vento é uma importante variável de estudo. Isso porque é utilizado para muitas finalidades, além de, em casos extremos, provocar desastres naturais. Pelo ponto de vista energético, ele é um importante ente na geração de energia eólica e, portanto, sua correta estimativa torna-se essencial. Ainda sobre essa temática, a estimativa do perfil vertical de vento torna-se importante, já que os aerogeradores não se encontram em superfície, mas em níveis mais altos. Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi estudar os perfis de vento offshore utilizando as metodologias de estimativas calculadas no trabalho de Carmo et al. (2021) e compará-las a uma nova metodologia desenvolvida em função da temperatura da superfície do mar (TSM) e temperatura do ar (T). Para tal, foram utilizados os dados da Reanálise ERA5, dados da plataforma P25 e dados da boia localizada na plataforma P18 no período entre 1° de agosto de 1999 e 31 de agosto de 1999. Os resultados mostraram que o método desenvolvido apresentou bons resultados para a região de estudo e que a atmosfera apresentou classe de estabilidade neutra, com valores de Skill Score (SS) e Nash–Sutcliffe Efficiency (NSE) relativamente mais representativos do que o dos outros métodos estudados. Comparativamente, a inserção da TSM e de T na estimativa dos perfis apresentou um ganho significativo na interpretação e precisão dos resultados.

Palavras-chave: Perfil de Vento; Energia; Temperatura.


INTRODUÇÃO

O Brasil, país localizado no continente da América do Sul, concentra grande parte de sua fronteira com o Oceano Atlântico, segundo o Censo Agro de 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2017), aproximadamente 10900 km ou, percentualmente, 39,2% de sua fronteira marítima. Isso é uma questão a ser ressaltada, uma vez que tanto as regiões costeiras brasileiras como as regiões offshore do Oceano Atlântico Sul mais distantes são importantes regiões, do ponto de vista social e econômico, para o país.

Por conta da sua extensão e de ventos favoráveis à exploração energética, o aumento da energia eólica vem tendo grande destaque. Na região onshore, a energia eólica já é uma realidade com grande parte dos parques eólicos localizados na região Nordeste do Brasil.

Especificamente na região offshore, a partir de 2019, com a perspectiva eminente de futuras explorações de energia eólica offshore no Brasil, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) realizou um workshop com diversos especialistas europeus e com diversas instituições brasileiras para determinar as regras de licenciamento ambiental para empresas que quiserem explorar essa região.

Desse ponto em diante, o número de pedidos de licenciamento vem aumentando constantemente, tendo grande parte localizada na costa dos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e região Sul. (IBAMA, 2022)

Por essas razões, cada vez mais o conhecimento e a estimativa dos ventos são imprescindíveis a todas as operações marítimas. Uma vez que as plataformas e as usinas eólicas apresentam diferentes estruturas e alturas, é importante ressaltar que as estimativas dos ventos são importantes não apenas próximo à superfície oceânica, mas em níveis superiores também. Mais especificamente para energia eólica, é imprescindível conhecer com grande precisão o perfil de vento em diferentes níveis atmosféricos, a fim de que não se instale um parque eólico em uma região desfavorável, ou para que o aerogerador não fique em uma altura que não seja a mais indicada. Quando isso acontece, podem ocorrer prejuízos e/ou minimização de lucros.

Camada limite atmosférica

Os processos de transporte na superfície terrestre neste limite modificam os níveis mais baixos de 100 m a 3000 m da atmosfera, criando o que é chamado de Camada Limite Atmosférica (CLA). Sabendo disso, a CLA pode ser definida como a parte da troposfera que é diretamente influenciada pela presença da superfície da Terra e responde às forçantes da superfície com uma escala de tempo de cerca de algumas horas ou menos. Essas forças incluem arrasto por atrito, evaporação e transpiração, transferência de calor, emissão de poluentes e modificação do fluxo induzido pelo terreno (Stull, 1988).

Classicamente, a camada limite atmosférica pode ser subdivida em várias subcamadas, como a Camada Limite Convectiva (CLC), Camada Limite Superficial (CLS), Camada Limite Residual (CLR), Camada Limite Estável ou Noturna (CLE ou CLN), Camada de Mistura (CM) e Zona de Entranhamento (ZE). Mais especificamente, a CLS, que é a região de interesse dos estudos voltados à energia eólica, é a região na parte inferior da CLA onde fluxos turbulentos e tensões variam em menos de 10% de sua magnitude (Arya, 1981).

Ao longo dos oceanos, a profundidade da camada limite varia de forma relativamente lenta no espaço e no tempo. A temperatura da superfície do mar muda pouco ao longo do ciclo diurno por causa da tremenda mistura no topo do oceano. Além disso, a água tem uma grande capacidade de calor, o que significa que pode absorver grandes quantidades de calor do sol com relativamente pouca mudança de temperatura. Assim, uma variação lenta da temperatura da superfície do mar significa uma variação lenta da força para o fundo da camada limite (Stull, 1988).

A maioria das mudanças na profundidade da camada limite sobre os oceanos são causadas por processos sinóticos e de mesoescala de movimento vertical e advecção de diferentes massas de ar sobre a superfície do mar. Uma massa de ar com temperatura diferente da do oceano sofrerá uma modificação à medida que sua temperatura se equilibra com a da superfície do mar. Uma vez que o equilíbrio é alcançado, a profundidade da camada limite resultante pode variar em apenas 10% ao longo de uma distância horizontal de 1000 km. Exceções a essa variação suave podem ocorrer perto das fronteiras entre duas correntes oceânicas de temperaturas diferentes (Stage e Weller, 1986).

Outro fator relevante é que no oceano há presença de ondas, o que aumenta ainda mais a complexidade de estimativa de perfis de vento. Isso porque a rugosidade é variável e vai se modificar conforme a altura significativa e período das ondas. Logo, considerar a rugosidade estática na região (como é feito em muitas regiões do continente) pode também levar a erros significativos (Donelan, 1990; Donelan et al., 1993; Carmo et al., 2021).

Nos oceanos ainda há uma outra complexidade na região da CLA. Sob condições de valores elevados de altura significativa de onda (Hs) há formação da chamada Camada Limite de Onda (CLO). Segundo Chalikov e Babanin (2019), a Camada Limite de Onda (CLO) é definida como a parte mais baixa da CLA, onde as flutuações produzidas pelas ondas influência a região atmosférica logo acima. A altura de CLO pode ser calculada em função da altura significativa de onda. Na Equação 1 (Chalikov, 1986) se encontra um exemplo de cálculo da estimativa da altura da CLO, estabelecido através da modelagem numérica de movimentos produzidos por ondas baseada nas equações bidimensionais de Reynolds, nas quais ξ é o coeficiente de ajuste. As alturas típicas de CLO podem ir de poucos metros, em casos mais extremos com Hs elevados, até quase 30 metros.

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Medidas nos oceanos perto da costa e parâmetros micrometeorológicos

No oceano, a forma de medição mais comum é pela coleta in situ (principalmente por boias meteoceanográficas) e sensores remotos. Os satélites são excelentes alternativas e podem ser aplicados a diversos outros parâmetros além dos ventos, tendo como vantagem a alta resolução espacial e temporal. Entretanto, os dados in situ podem proporcionar uma maior acurácia nas medidas.

Com a escassez de dados medidos verticalmente, se torna necessário estimar o perfil de vento de uma determinada região através de algum método alternativo ou em regiões alternativas. Contudo, nem sempre os conhecidos métodos de cálculo dos perfis são adequados à aplicação direta sobre os oceanos e, em grande parte das vezes, podem gerar resultados imprecisos.

Sabendo da escassez de sensores remotos, como LIDARs, por exemplo, para medição de vento em níveis mais altos, foi necessário investigar alguns métodos alternativos para a determinação desses perfis. O mais utilizado e mais conhecido é o método de perfil logaritmo de vento. Através das medidas in situ, pôde ser observado que os perfis de vento foram aproximadamente logaritmos e, portanto, seria possível determinar uma equação que representasse esse perfil. Logo, através do teorema de Pi-Buckingham (Kantha e Clayson, 2000) e da teoria da similaridade de Monin e Obukhov (Monin e Obukhov, 1954; Wyngaard, 1973; Sorbjan, 1986; Stull, 1988) integra-se a Equação 2, obtém-se a Equação 3, na Camada Limite de Superfície (CLS), para chegar na velocidade do vento para uma determinada altura z:

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na qual u é a velocidade do vento, u* é a velocidade de fricção, k é a constante de Von-Karman, Zo é a rugosidade e L é o comprimento de Monin-Obukhov.

Na Equação 3, o termo ψ_M da função de correção da estabilidade é convencionalmente separado em três classes de estabilidade: estável, instável ou neutro. É importante estabelecer de forma adequada a classe a ser a ser utilizada, uma vez que nas condições não neutras, os parâmetros de flutuabilidade e de fluxo de calor serão considerados nos cálculos das equações.

Carmo et al. (2021) mostram que, utilizando os mesmos métodos de estimativa de velocidade de fricção e rugosidade, mas com classes de estabilidade diferentes, os perfis de vento apresentavam diferenças significativas em níveis mais elevados da atmosfera, bem como, consequentemente, o potencial eólico diferia muito nos cenários neutro e de estabilidade. Logo, os autores mostraram a importância do cálculo correto do termo ψ_M de correção de estabilidade e, consequentemente, a correta estimativa do comprimento de Monin-Obukhov (L).

Além do parâmetro de estabilidade e do L, a rugosidade (z0) e velocidade de fricção (u*) possuem grande relevância nos cálculos dos perfis de vento. Especificamente a rugosidade possui inúmeras soluções. Para a região offshore, por exemplo, as soluções mais utilizadas são de Charnock (1955), Donelan (1990), Donelan et al. (1993), Chalikov (1995) e Taylor e Yelland (2001). Além disso, Simiu and Scanlan (1978), Panofsky e Dutton (1984), Dyrbye e Hansen (1997) e JCSS (2001) também apresentaram valores de rugosidade ou gama (termo da lei da potência) para diferentes superfícies, o que facilitou muito os cálculos computacionais (Carmo et al., 2021).

Alguns autores como Lange et al. (2004) mostraram que os modelos de estimativa de rugosidade conduziram apenas a pequenas diferenças. Já He et al. (2019) encontraram resultados de z0 com um viés sistemático nos modelos de estimativa, e propuseram uma mudança no expoente de potência de z0.

Conforme Carmo et al. (2021) mostraram, apesar de alguns modelos apresentarem bons resultados, as pesquisas na temática dos perfis de vento ainda precisam avançar muito, uma vez que os métodos ainda são ineficientes em muitas situações e, portanto, um método mais abrangente deve ser composto de modo a melhorar os resultados e apresentar valores de vento e potencial eólico mais próximos da realidade, minimizando os prejuízos.

Sabendo disso, o objetivo desse trabalho foi estimar uma nova metodologia de perfis de vento, comparando às metodologias usadas no trabalho de Carmo et al. (2021) para a região offshore perto da costa Sudeste do Brasil. Aqui, utilizando-se os dados da reanálise ERA5, da boia localizada na região da plataforma P18 e de um anemômetro localizado na plataforma P25.

MÉTODOS E DADOS

Dados

Foram utilizados os dados de Altura Significativa de Onda (Hs), período de pico (Tp), temperatura do ar (T), temperatura da superfície do mar (TSM) e magnitude e direção do vento através das reanálises do ERA5 (com resolução espacial de 0.25°x0.25º para os dados meteorológicos e 0.5°x0.5° para os dados oceanográficos), dados da boia localizada na região da plataforma P18, dados de vento localizados na plataforma P25 no período entre 01/08/1999 e 31/08/1999, com resolução temporal de 1 hora para o ERA5 e resolução temporal de 15 minutos para os dados da boia e plataforma. Na Figura 1 estão os pontos estudados.

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Metodologia

Em relação à metodologia utilizada para os cálculos dos perfis de vento, foram utilizadas as mesmas metodologias dos perfis utilizados, testados e comparados no artigo de Carmo et al. (2021) (metodologias 1, 2, 3 e 4) e uma nova metodologia (método 5) desenvolvida utilizando a T e TSM.

Inicialmente, para todos os métodos, serão utilizados o teorema de Pi-Buckingham (Kantha e Clayson, 2000) e a teoria da similaridade de Monin e Obukhov (Monin e Obukhov, 1954; Wyngaard, 1973; Sorbjan, 1986; Stull, 1988) para sua determinação. Como visto no tópico anterior, ao integrar a Equação 2 é obtida a Equação 3, de velocidade do vento para uma altura z qualquer da região. Logo, em um primeiro momento, foi considerada a aproximação para um perfil da classe de estabilidade neutra (ψ_M), assim como é proposto no manual da DNV-RP-C205 de 2014 (Equação 4 – adaptada da equação 3).

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Posteriormente, serão considerados perfis médios estáveis, já que algumas regiões podem apresentar esse regime atmosférico característico, como foi o caso próximo à costa do Maranhão, visto no trabalho de Carmo et al. (2021).

Para ficar mais claro, abaixo, segue cada uma das metodologias aplicadas para cada situação simulada.

Método 1: Valores típicos de z0 para diferentes localizações (DNV-RP-C205, 2014; Simiu e Scanlan, 1978; Panofsky e Dutton, 1984; Dyrbye e Hansen, 1997; JCSS, 2001)

Nesse método serão determinados os valores de rugosidade z0 em função dos intervalos de valores máximos e mínimos encontrados nas regiões oceânicas. Esses valores podem ser encontrados na Tabela 1, baseada em função do manual da DNV-RP-C205 (2014) para os valores encontrados por Simiu e Scanlan (1978), Panofsky e Dutton (1984), Dyrbye e Hansen (1997) e JCSS (2001).

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Esses valores máximos (0.01) e mínimos (0.0001) foram escolhidos por estarem dentro dos intervalos das três classes da Tabela 1 e também por estas classes serem as utilizadas em estudos offshore. São elas: mar aberto sem ondas (open sea without waves), mar aberto com ondas (open sea with waves) e área costeira com ventos (coastal areas with onshore wind). Isso é muito importante, uma vez que com esses limiares dos extremos é possível estabelecer os máximos e mínimos da magnitude do vento naquele determinado nível para qualquer tipo de situação, considerando uma atmosfera neutra.

Já o termo da velocidade de fricção foi calculado pela velocidade média do vento a uma determinada altura H (uH) acima da superfície do mar (método indireto). Por conseguinte, u* foi obtido pela Equação 5, na qual o ω é considerado o coeficiente de arrasto (surface friction coeficient ou surface drag coeficient), definido pela Equação 6, e β é o logaritmo da altura pela rugosidade ao quadrado.

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Com as Equações 5 e 6 resolvidas e considerando as rugosidades mínima e máxima estabelecidas, calcula-se as velocidades do vento máxima e mínima para uma altura z pelas Equações 7 e 8 (adaptadas da Equação 4), considerando, neste caso, uma atmosfera neutra.

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Método 2 – Perfil de vento calculado a partir de z0 de Donelan (1990)

Nesse método, o valor da rugosidade foi calculado pelo método de Donelan (1990), que obteve, por meio de experimentos de campo, valores z0 provenientes de uma função direta da altura significativa de ondas, dada pela Equação 9.

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Utilizando novamente as Equações 5 e 6 para determinação da velocidade de fricção, obtém-se, portanto, a velocidade do vento para uma altura z pela Equação 10 para uma atmosfera neutra.

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Método 3 – Perfil de vento calculado a partir de z0 de Donelan et al. (1993)

Donelan et al. (1993) determinaram uma relação entre a rugosidade e o termo de parâmetro de idade da onda por meio de experimentos e testes numéricos. A representação desses termos é muito importante, porque eles influenciam o estado do mar na Camada Limite de Onda (CLO). Por conseguinte, na Equação 11 se encontra a solução utilizada para o cálculo da rugosidade.

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Utilizando novamente as Equações 7 e 8 para determinação da velocidade de fricção, obtém-se, portanto, a velocidade do vento para uma altura z através da Equação 12 para uma atmosfera neutra.

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Método 4 - Perfil de vento calculado a partir de z0 de Taylor e Yelland (2001), para diferentes classes de estabilidade atmosféricas

Tendo em vista que o método de Taylor e Yelland (2001) é o principal na estimativa de rugosidade oceânica e vem sendo utilizado em trabalhos constantemente, com diversas aplicações nas correções e mudanças nos seus parâmetros de ajuste, também será aplicado nesse estudo. Além dele, agora será também inserido o cálculo das classes de estabilidade da atmosfera: instável, neutra e estável. Logo, o termo L precisará ser calculado. Para tal, estes foram calculados utilizando as relações e solução de Businger et al. (1971), Dyer (1974), Nickerson e Smiley (1975), Benoit (1977), Arya (1988), Hansen et al. (2012) e Carmo et al. (2021).

Por conseguinte, foi utilizada a Equação 13, que representa o método de Taylor e Yelland (2001). Como já dito, este método geralmente leva aos melhores resultados, isso porque utiliza a altura significativa de onda (Hs) e período de pico (Tp) nos seus cálculos. Portanto, z0 irá representar grande parte dos processos envolvidos nessa região.

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Utilizando novamente as Equações 7 e 8 para determinação da velocidade de fricção, obtém-se, portanto, a velocidade do vento para uma altura z pelas Equações 14 (atmosfera estável), 15 (atmosfera neutra) e 16 (atmosfera instável), sendo ζ função de z/L.

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Método 5 – Novo método desenvolvido – Cálculo de z0 e ψ_M em função de T, TSM, Hs e Tp

De modo a aumentar mais ainda a precisão dos resultados para os perfis de vento, nesse trabalho será desenvolvido um novo método que será adaptado dos métodos de Taylor e Yelland (2001) e Carmo et al. (2021) para rugosidade. Esse método será inovador, pois além de utilizar as variáveis de Hs e Tp, já incluídas em Taylor e Yelland (2001) e Carmo et al. (2021), também irá utilizar as variáveis de temperatura do ar (T) e temperatura da superfície do mar (TSM). Esse foi um passo importante, pois ao inserir T e TSM, indiretamente, será representado o fluxo de calor na região e dará uma melhor ideia de sua direção e intensidade. Na Figura 2 está um exemplo do processo comentado.

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De modo mais claro, nesse novo método, os parâmetros de ajuste do método da rugosidade de Taylor e Yelland (2001) serão calculados empiricamente em função da razão de T e TSM, obtendo-se valores mais representativos para a região de interesse. Já para os cálculos do parâmetro de instabilidade, serão utilizados como novos parâmetros de correção para o comprimento de Monin-Obukhov e, consequentemente, para o número de Richardson. Utilizando novamente as Equações 7 e 8 para determinação da velocidade de fricção, obtém-se, portanto, as Equações 17 e 18 para rugosidade e perfil.

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RESULTADOS

Na Figura 3 está a camada limite de onda (CLO) média para o período estudado na região dos pontos de interesse. Nota-se que, nesse caso, a CLO não ultrapassa o valor de 10 metros. Logo, desprezá-la (apenas nessa situação específica) não acarretará grandes problemas nas estimativas dos perfis de vento, isso porque os perfis são estimados levando em consideração o vento a 10 metros. Em casos em que a sua altura ultrapasse esse valor, é necessário considerá-la e, consequentemente, reavaliar a metodologia de estimativa dos perfis, incluindo nestas a altura da CLO parametrizada.

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Nas Figuras 4a, 4b e 4c estão as rosas dos ventos (com direção e magnitude do vento) da reanálise ERA5, para o ponto da boia localizada na plataforma P18 e para a plataforma P25. Comparando, qualitativamente, os resultados do ERA5 (Figura 4a) com a boia P18 (Figura 4b), nota-se que houve pouca diferença na direção do vento, exceto no quadrante sudeste (entre 90° e 135°), no qual houve uma pequena diferença na direção. Em relação à magnitude, os maiores valores foram registrados na boia P18. Já comparando os dados da plataforma P25 (Figura 4c) aos dados da boia P18 (Figura 4b), nota-se que também não houve variação significativa na direção do vento e, nesse caso, isso pode ser uma importante consideração, pois significa que a direção do vento pode não estar variando significativamente com a altura. Logo, isso pode ser um indicativo de que o perfil atmosférico médio da região deve ser neutro. Isso será confirmado (ou não) nas figuras de perfis de vento que serão apresentadas mais à frente.

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Na Figura 5 estão a comparação e a diferença entre a altura significativa de onda do ERA5 com o da boia localizada na região da plataforma P18. Nota-se que o ERA5 apresentou maiores diferenças em relação à boia nos valores mais elevados de Hs. Essas diferenças muitas vezes são esperadas, uma vez que alguns trabalhos como, por exemplo, o estudo de Carmo et al. (2020), que mostra que são justamente nos valores extremos que a reanálise ERA5 acaba destoando dos valores observados de Hs. Isso evidencia ainda mais a importância da utilização das boias meteoceonográficas nas estimativas dos perfis, já que alguns dos métodos utilizam a altura significativa como dado de entrada. Logo, utilizar o ERA5 pode ajudar ainda mais na propagação de erro.

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Nas Figuras 6, 7, 8 e 9 estão a comparação e a diferença entre a magnitude do vento estimada pelo método da DNV, o novo método desenvolvido para a boia P18 (Figuras 6 e 7) e dos dados na plataforma P25 (Figuras 8 e 9). Na comparação das figuras, nota-se, qualitativamente, que os dois métodos acabam subestimando os valores de vento em relação aos dados observados tanto da boia como da plataforma. Apesar disso, no caso do método desenvolvido parece haver uma maior assertividade em relação ao método da DNV.

Essa maior assertividade pode ser confirmada nas Tabelas 2 e 3, mostrando que o modelo teve melhores resultados para o BIAS, NSE e SS. AS correlações foram parecidas e o método desenvolvido teve um ligeiro aumento no desvio padrão, o que não influencia a sua performance, já que essa diferença (nos dois casos) não excede o valor de 0,3. Outro fator interessante a ressaltar é que, no estudo de Carmo et al. 2021, essa diferença, entre o método da DNV e novos métodos sugeridos por ele, foi maior e o modelo teve uma performance ainda melhor, isso porque, na região estudada pelos autores, o regime atmosférico característico da região se mostrou estável (ao contrário das regiões da P18 e P25, que mostraram um regime caracteristicamente neutro, o que se aproxima mais dos métodos propostos pela DNV).

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Já na Figura 10 estão os perfis médios de agosto de 1999 estimados por cada um dos métodos. Nessa figura nota-se alguns fatores relevantes. Apesar dos métodos de Donelan (1990) e Donelan et al. (1993) estarem bem próximos (em média) aos valores observados na plataforma P25, nota-se que a curva dos perfis de ventos desses métodos está bem diferente do que seria considerado “ideal”. Ou seja, em superfície, os valores estimados estão bem distantes dos valores observados na boia localizada na P18. Já no método desenvolvido, os valores estão próximos tanto na P18 quanto na P25, o que confirma que o perfil está mais próximo ao característico da região. Esse resultado possui grande relevância e confirma o que foi mostrado nas tabelas anteriores, já que ele mostra que a inserção da Temperatura e da TSM ajudaram a ajustar os perfis a apresentarem resultados mais precisos.

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Por último, nas Figuras 11 e 12 estão exemplos das estimativas de rugosidade média pelos métodos de Donelan (1990) e para o método desenvolvido para o período de agosto de 1999. Nota-se que, com a inserção da TSM e T (no novo método), a rugosidade calculada apresenta variações desse parâmetro em localidades que não apareciam no método de Donelan (1990), por exemplo. Ou seja, esse método pode vir a trazer maior assertividade se utilizado em outras localidades, por exemplo. Indo mais a fundo, utilizar um valor de rugosidade tabelado, ou seja, sem variar o seu valor no espaço e no tempo, pode implicar em erros maiores ainda, que foram mostrados, por exemplo, nesse estudo e no estudo de Carmo et al. (2021) e He et al. (2019).

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CONCLUSÕES

Dentre as conclusões, pode-se ressaltar que novas metodologias de estimativas de perfis de vento são bem-vindas, e que o assunto ainda não está esgotado. Por conseguinte, em relação à rugosidade, foi visto que diferentes métodos provocaram resultados significativamente distintos. Logo, para a região de interesse de cada estudo deverão ser testados cada um desses métodos a fim de ver qual apresenta melhores resultados.

No trabalho de Carmo et al. (2021), por exemplo, o método de Taylor e Yelland se mostrou mais satisfatório do que os outros, como o de Donelan (1990) e Donelan et al. (1993). Já nesse estudo, o método de rugosidade de Taylor e Yelland (2001) adaptado a T e TSM mostrou resultados ainda mais satisfatórios, o que mostra que ainda há avanços a serem feitos.

Lange et al. (2004) mostraram em seu estudo que os modelos para a estimativa da rugosidade conduziram apenas a pequenas diferenças. Contudo, nesse trabalho mostrou-se que essa diferença modificou totalmente os resultados.

Já no caso do parâmetro de correção de estabilidade, esse estudo concluiu que é necessário calculá-lo, independente se a região é neutra, estável ou instável. Carmo et al. (2021) mostraram que a região de interesse do estudo dos autores era estável e, portanto, acabava modificando significativamente os resultados. Já nesse estudo, apesar de a região ser classicamente neutra, adotar um valor de estabilidade zero não é o ideal, uma vez que o valor não é zero, mas próximo a zero. Isso vai produzir erros nas estimativas dos perfis e mudar o perfil logaritmo dos ventos estimados. Esses erros acabam se propagando significativamente em outros cálculos importantes, como, por exemplo, nos estudos de potencial eólico (já que o potencial é função do vento ao cubo).

Indo nessa linha, conclui-se ainda que, quando há erros concomitantes entre a rugosidade e a determinação de estabilidade, o problema é ainda maior. Logo, deve-se tomar muito cuidado ao estimar esses perfis no oceano, uma vez que ele possui rugosidade “viva”. Ou seja, isso significa que esta é diretamente influenciada pela altura significativa de ondas na região, e não é um valor fixo e estático, como já dito. Aumentando ainda mais a complexidade, quanto maior forem os valores de altura significativa de onda, maior será a altura da Camada Limite de Onda (CLO). Isso implica numa mudança nos paradigmas de estimativa dos perfis de vento, isso porque, dentro da CLO, os ventos terão comportamentos diferentes daqueles estimados para a Camada Limite de Superfície.

Em suma, esse trabalho mostra a importância dos cálculos dos parâmetros micrometeorológicos de forma correta para sua região, bem como a importância de determinar a sua classe de estabilidade. Sem essas, os resultados dos modelos podem mostrar uma estimativa equivocada e produzir estudos inadequados e que não representarão a fiel realidade da região de interesse.

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Recebido: 1 dez. 2022

Aprovado: 4 dez. 2023

DOI: 10.20985/1980-5160.2023.v18n3.1911

Como citar: Carmo, L.F.R., Palmeira, A.C.P.A., Belo, W.C., Nunes, L.M.P. (2023). Desenvolvimento e aplicação de nova metodologia de perfis de vento offshore. Revista S&G 18, 3. https://revistasg.emnuvens.com.br/sg/article/view/1911