Inovações para a pesca artesanal: subsídios para o desenvolvimento da atividade no estado do Ceará

Rochelle Cruz de Araujo Bezerra Vidigal

rochelle.cruz@cedepesca.net

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.

Halana Rodrigues Freire Eloy

halanarodrigues@gmail.com

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.

Karla Maria Catter

kmcatter@yahoo.com.br

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.

Rossi Lelis Muniz Souza

rossilelis@gmail.com

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.

Viviana Lisboa

viviana.lisboa.lisboa@gmail.com

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.

João Felipe Nogueira Matias

jfn.matias@gmail.com

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.

Adylla Maia Cruz

adyllamaia@hotmail.com

Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, Fortaleza, CE, Brasil.


RESUMO

A pesca no Ceará, mesmo com sua elevada importância socioeconômica, apresenta grandes problemas. Dentre eles está a ausência de um programa de coleta de dados. Essa falta incide na falta da tomada de decisões e apoio ao desenvolvimento de políticas públicas. Com vistas a subsidiar o desenvolvimento da pesca no estado do Ceará, este artigo apresenta inovações utilizadas em outras pescarias no mundo e no Brasil que possam ser adequadas ao estado. Objetivo: proporcionar a modernização da pesca artesanal e a melhoria da qualidade de vida dos pescadores. Com base em revisão sistemática da literatura, concernente às inovações para pescarias de pequena escala e elencando a alguns problemas enfrentados pela pesca artesanal, definiu-se o co-manejo, o uso de aplicativos para o monitoramento e o comércio justo (fair trade) como inovações para impulsionar mudanças positivas nas comunidades pesqueiras do Estado. Os resultados apontam que a gestão compartilhada entre governo e usuários, através do manejo participativo, é uma medida favorável no gerenciamento da pesca artesanal e o uso de aplicativos para o monitoramento da pesca pode suprir a ausência de informações. Enquanto isso, o desenvolvimento de um comércio justo, criará oportunidades de mercado levando em consideração os aspectos sociais, econômicos e ambientais.

Palavras-chaves: Pesca Artesanal; Inovação; Co-manejo; Monitoramento; Comércio Justo.


INTRODUÇÃO

Desde o início da década de 1980, a importância da adoção de inovações tem sido cada vez mais discutida, ganhando destaque pela sua capacidade de dinamizar e impulsionar o desenvolvimento econômico (Santos e Bastos, 2009).

O manual de Oslo (OCDE, 2005), elaborado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, discorre que inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou melhorado, um processo, método de marketing, ou um novo método organizacional. O desenvolvimento de inovações tecnológicas para a pesca favorece a sustentabilidade dos alimentos, mantendo constante a oferta de pescados e produtos da pesca (Fujii et al., 2017). As inovações de processos não necessariamente requerem uma inovação de tecnologias (Menezes et al., 2011) e podem gerar um ambiente favorável à sustentabilidade das pescarias e melhorar o desenvolvimento local.

No Brasil, a atividade pesqueira é regulamentada pela Lei Nº 11.959, de 29 de junho de 2009, que dispõe sobre a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca. Para efeitos desta lei, a pesca comercial artesanal é “aquela praticada diretamente por pescador profissional, de forma autônoma ou em regime de economia familiar, podendo utilizar embarcações de pequeno porte” (Brasil, 2009, p. 4). Para FAO (2017), a pesca de pequena escala funciona como um motor econômico e social que, além de proporcionar para a economia local uma segurança alimentar, emprego e diversos outros efeitos multiplicadores, apoia os meios de subsistência das comunidades ribeirinhas.

Apesar da grande extensão da costa brasileira e o potencial continental na captura de pescado, a pesca apresenta-se estabilizada, com a maioria dos recursos pesqueiros de interesse econômico ameaçados devido à interferência humana. Além disso, a atividade se encontra historicamente atrasada no que diz respeito às tecnologias e políticas mais adequadas aos interesses dos usuários, que ainda sofrem por serem pouco considerados nos processos de tomada de decisão (Silva, 2014).

Como o objetivo de proporcionar a modernização da pesca artesanal e a melhoria da qualidade de vida dos pescadores artesanais, este artigo visa apresentar inovações já utilizadas em outras pescarias no mundo e no Brasil, as quais possam ser adequadas à pesca artesanal no estado do Ceará.

METODOLOGIA

Diante do exposto, o trabalho foi desenvolvido através de revisão bibliográfica sistemática realizada durante um período de seis (6) meses, sendo utilizados trabalhos científicos, dissertações, teses, dentre outros.

Inicialmente, foi realizada uma pesquisa sobre a produção pesqueira no mundo e uma busca por dados gerais disponíveis sobre a pesca no Brasil e suas problemáticas, utilizando palavras-chave como “produção pesqueira”, “pesca no Brasil” e “pesca artesanal”.

Após essa primeira etapa, e com os problemas descritos, foi realizado outro levantamento bibliográfico buscando inovações utilizadas para a pesca artesanal no mundo e no Brasil, através do uso dos termos: “inovações pesca artesanal”, “ausência de dados” e “organização de comunidades”, que além de suprir as lacunas anteriormente identificadas, pudessem ser implementadas para o desenvolvimento da pesca no Ceará.

RESULTADOS

A pesca no mundo

De acordo com FAO (2018), a produção pesqueira mundial em 2016 (incluindo peixes, crustáceos, moluscos e outros animais aquáticos), foi de 170,9 milhões de toneladas. Destes, a aquicultura representou 47% (80 milhões de toneladas) e a pesca de captura 53% de (90,9 milhões). As estatísticas indicam que 40,3 milhões de pessoas participaram no setor primário da pesca de captura e que as mulheres representaram em torno de 14%. Havendo uma diminuição de 15% nas pessoas que se dedicaram à pesca entre os anos de 1990 a 2016. A produção pela pesca apresentou um pequeno decréscimo em comparação aos últimos dois anos, passando de 91,2 milhões em 2014 para 90,9 em 2016. Diferentemente da aquicultura, que permaneceu crescendo (Tabela 1). Em águas continentais, foram capturados 11,6 milhões de toneladas de peixes no mundo, representando 12,8% da captura total. Mostrando um incremento de 2,0% em comparação ao ano de 2015 e de 10,5% em relação à média de 2005 a 2014. No entanto, parte do incremento pode estar relacionado a melhora da recopilação e avaliação dos dados nacionalmente. A maioria dos países produtores mostra um aumento das capturas nos últimos anos. O Brasil, que é o principal produtor na América do Sul, não tem enviado a FAO dados oficiais sobre as capturas desde 2014.

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Em 2016, as capturas marinhas totais a nível mundial apresentaram um decréscimo de quase 2 milhões de toneladas em comparação às registradas em 2015. As pescarias de anchoveta (Engraulis ringens) no Peru e Chile representaram 1,1 milhões de toneladas dessa diminuição. Bem como espécies importantes em outros países, como os cefalópodos, também experimentaram uma redução nas capturas entre 2015 e 2016. Enquanto isso, a China que é o maior produtor mundial, permaneceu estável. Os grupos de espécies valiosas, com uma produção significativa de lagostas, caranguejos, gastrópodes e camarões, registraram um histórico de capturas máximo em 2016 (FAO 2018). Conforme Silva (2014), o principal motivo da redução nos volumes de captura ao longo dos anos, foi a sobre-explotação dos estoques pesqueiros. Enquanto a indústria foca no presente sem levar em consideração as necessidades humanas a longo prazo, os gestores tentam manter o status quo em um ambiente instável (Pontecorvo, 2008).

Ainda segundo a FAO (2018), a porcentagem de populações de peixes marinhos explotados a níveis biologicamente insustentáveis se incrementaram, passando de 10% em 1974 a 33,1% em 2015, com o maior acréscimo registrado ao final dos anos 70 e 80, trazendo uma grande preocupação. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas incluem a meta 14.4 destinada a efetivamente regular, até 2020, a captura e acabar com a sobrepesca, ilegal, não reportada e não regulamentada e as práticas de pesca destrutivas, e implementar planos de gestão com base científica, para restaurar populações de peixes no menor tempo possível, pelo menos a níveis que possam produzir rendimento máximo sustentável, como determinado por suas características biológicas (ONU, 2020). No entanto, parece pouco provável que as pescarias mundiais possam restabelecer os 33,1% das populações que se encontram sobre-explotadas atualmente, pois requer tempo e geralmente de dois a três vezes o ciclo de vida da espécie (FAO, 2018).

De acordo com SAPOPEMA (2019a), um dos grandes problemas da pesca no Brasil é a falta de estrutura para os principais elos da cadeia produtiva. Resultando na fragilização da atividade, especialmente entre o desembarque e a distribuição do pescado, pois não gera informações sobre o uso do recurso e sua entrada na cadeia produtiva formal, levando o consumidor a adquirir um produto de origem e qualidade desconhecidas.

Os dados estatísticos são cada vez mais indispensáveis para o sistema de informação de uma sociedade democrática, servindo às diferentes esferas de governo, às empresas privadas e à população em geral (MPA, 2012). No entanto, Vasconcellos et al. (2007), afirmam que a precariedade das estatísticas da pesca artesanal é reconhecida no mundo inteiro. Não sendo diferente no Brasil, onde a pesca artesanal sofre de uma carência de informações biológicas e socioeconômicas. Essa insuficiência é causada tanto pela dispersão das comunidades de pescadores, dificultando um sistema de coleta, quanto a pouca importância e visibilidade dada pelos órgãos governamentais, os quais priorizavam a pesca industrial. Além disso, a pesca artesanal foi dividida historicamente por ambiente (marinho e continental), com metodologias diferenciadas para a coleta e análise dos dados. Onde os estados adotaram suas próprias estruturas de monitoramento, dificultando a padronização das informações (Silva, 2014).

Durante muitos anos, as informações utilizadas para a consolidação da estatística de pesca marinha nacional eram coletadas pelo IBAMA, através do programa de monitoramento ESTATPESCA. Com a inserção do MPA, o programa foi gradativamente substituído com o objetivo de tornar a coleta de dados de produção de pescado mais robusta e eficaz (MPA, 2012). No entanto, os conflitos entre instituições governamentais e a segregação de responsabilidades atravancaram o desenvolvimento de uma política para o monitoramento e estatística (Silva, 2014). No Brasil, desde 2008 não se tem um programa de coleta de dados, o Ministério da Pesca e Aquicultura publicou dados de estatísticas até 2011.

A produção de pescado no Brasil para o ano de 2011, conforme o MPA (2013a), foi de 1.431.974,5 t. A principal fonte de produção de pescado nacional é a pesca extrativa marinha, sendo responsável por 553.670,0 t (38,7% do total de pescado), seguida pela aquicultura continental (544.490,0 t; 38,0%), pesca extrativa continental (249.600,2 t; 17,4%) e aquicultura marinha (84.214,3 t; ~6%). A pesca extrativa totaliza 803.270 t. (Tabela 2). O número de pescadores registrados pelo MPA em 2012, foi de 1 milhão e quarenta e um mil, sendo: 47,02% na região Nordeste, 36,83% no Norte, 8,20% no Sudeste, 6,16% no Sul e 1,79% no Centro-oeste. Os estados com maior número de pescadores são: Pará (253.084) Maranhão (175.166), Bahia (125.827) e Amazonas (85.129). Do total, 1.033,124 pescadores exercem a atividade artesanalmente e 8.843 exercem em sua forma industrial (MPA 2013b).

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A região Nordeste registra a maior produção de pescado da pesca extrativa no país, com 248.531,9 t, respondendo por 30,9% da produção nacional. As regiões Norte, Sul, Sudeste e Centro-oeste registraram, respectivamente, 231.409,8 t (28,8%), 163.987,5 t (20,4%), 163.987,5t (15,8%) e 13.836,6 t (6,2%). Partindo do pressuposto que a pesca industrial ocorre com mais intensidade nas regiões Sul e Sudeste (37,8% da produção total), pode-se concluir que a pesca artesanal é responsável pela grande maioria do pescado consumido no Brasil.

O estado do Ceará apresenta grande importância no contexto nordestino e brasileiro como um dos grandes produtores (Fonseca, 2019). Segundo o MPA (2013b), o estado ocupou, em 2011, a sétima posição na pesca extrativa marinha, com uma produção de 21.788,0 t e a sexta posição na pesca extrativa continental, produzindo 11.370,1 t de pescados. Em um total de 29.970 pescadores registrados em 2012, representando 2,88% da quantidade de pescadores no Brasil, no Sistema do Registro Geral da Atividade Pesqueira (SISRGP). Não sendo possível, dessa maneira, obter informações mais atualizadas, uma vez que não existe um programa de monitoramento em vigor no estado.

No período de janeiro a novembro de 2019, o Ceará bateu recorde na exportação de pescados, mantendo-se como líder no Brasil. O Ministério da Economia, através da Secretaria do Comércio Exterior (Comex Stat), divulgou que o Estado do Ceará exportou 8,7 mil toneladas de pescados, entre peixes, crustáceos e moluscos, ultrapassando todos os outros estados, atingindo um faturamento de US$ 75,3 milhões. Em segundo lugar, aparece o estado do Pará que exportou 7 mil toneladas, seguido de Santa Catarina, com 6,5 mil toneladas (Governo do estado do Ceará, 2019).

Co-manejo como processo para gerenciar pescarias

Sen e Nielsen (1996) definem o co-manejo (ou manejo participativo, manejo comunitário etc) como o compartilhamento de responsabilidades entre o governo e os grupos usuários no gerenciamento dos recursos. Formando uma estrutura de co-gestão adaptativa, a qual pode resolver a incerteza e a complexidade da pesca (Hai, 2018), como uma solução para os problemas crescentes de sobre-explotação.

Segundo Gutiérrez et al., (2011), o incentivo a pesca responsável, a melhoria da gestão através do uso do conhecimento local, a propriedade coletiva dos usuários na tomada de decisão, o melhor monitoramento e controle, sensibilidade às restrições socioeconômicas e ecológicas locais, são algumas vantagens do co-gerenciamento. Em diferentes sistemas de pescarias no mundo, a gestão compartilhada entre o governo e usuários locais tem se mostrado uma medida promissora na gestão da pesca artesanal (Vieira et al., 2015). Além dos pontos positivos, os sistemas descentralizados apresentam desafios, pois o co-manejo requer informações (socioeconômicas e institucionais), que devem estar disponíveis tanto para os usuários locais como para os gestores (Vasconcellos et al., 2007).

Sob um regime ideal de co-gerenciamento, os grupos de usuários devem participar de todas as etapas (planejamento, implementação ou avaliação), as quais envolvem o processo de gerenciamento. No entanto, Oviedo e Bursztyn (2017) dissertam que, as relações interorganizacionais da gestão local dos recursos naturais, quando avaliadas em detalhes, muitas vezes não possuem autoridades representativas e poderes suficientes, levando a uma não participação em todo o processo. Reafirmando que para ocorrer uma descentralização efetiva, a gestão participativa das instituições locais tem de ser melhorada, com suas estruturas organizacionais fortalecidas.

O co-manejo, realizado pelos pescadores artesanais e o governo na Lagoa do Patos no Rio Grande do Sul, resultou na determinação de áreas de pesca (Kalikoski et al., 2002). Na Amazônia, o manejo comunitário foi usado como solução para o problema de sobre-exploração do pirarucu (Arapaima gigas), com a participação dos pescadores na avaliação dos estoques, determinação de cotas de captura e fiscalização das regras de manejo (Viana et al., 2007).

Os modelos de manejo participativo podem ser encontrados em todo o país. Kalikoski et al., (2009), elucidam que, no Brasil, os processos de gestão participativa são encontrados em unidades de proteção integral, em unidades de uso sustentável, e fora de unidades de conservação, referindo-se aos acordos de pesca e manejo comunitário na Amazônia, Fóruns de Pesca na região Sul e outros processos em águas interiores e costeiras no Brasil. Os autores identificam o Norte como a região com mais iniciativas e a região Nordeste, como a região onde há maior ocorrência de processos na área costeira, principalmente nas unidades de conservação. Estes mesmos autores, realizando uma revisão bibliográfica de experiências de gestão comunitária no Brasil, identificaram como principais oportunidades: (i) apoio para organizações comunitárias, (ii) acordos informais visando à exploração moderada do recurso, (iii) criação de fontes alternativas de renda, (iv) fornecimento de informações e cursos para a população local e, (v) desenvolvimento de liderança comunitária. Os principais desafios são: (i) conflitos interescalares, (ii) sobre-exploração dos recursos, (iii) delegação de pouco poder à população, (iv) falha na atuação de instituições responsáveis e, (v) falta de união e/ou organização local.

A região do Baixo Amazonas é um exemplo no desenvolvimento de políticas de co-manejo pesqueiro no Brasil, com um Sistema de Conselhos Regionais de Pesca responsável pela elaboração e implementação de Acordos de Pesca intercomunitários, envolvendo mais de 130 comunidades e 35 mil pessoas. Diversos Projetos de Assentamento Agroextrativista (PAE’s) foram criados e elaborados Planos de Utilização (PU), os quais incorporam os Acordos de Pesca que já são reconhecidos em Instruções Normativas. Esse PAE tem grande potencial para ser a principal unidade política de co-manejo pesqueiro. Ainda conforme SAPOPEMA (2019a), o Plano de Desenvolvimento Sustentável da Pesca e Piscicultura do Baixo Amazonas se apresenta como um dos Eixos Estratégicos para uma Política de co-manejo pesqueiro, sendo, dessa maneira, elaboradas metas para que se obtenha um sistema que permita que as comunidades manejem os recursos pesqueiros de forma sustentável, recuperando os estoques sobre-explotados e possibilitando um monitoramento eficaz que gere dados sobre os impactos das medidas adotadas na pesca.

Analisando os benefícios trazidos pelo sistema de co-manejo no Baixo Amazonas, em termos de produtividade e conservação, Almeida et al., (2006) identificaram que houve aumento de produtividade (CPUE) e conservação para os lagos manejados, quando comparados a lagos não manejados.

Gutiérrez et al., (2011), conduziram um estudo para identificar evidências quantitativas e qualitativas dos impactos positivos de um co-manejo em pescarias em todo o mundo. Dos 218 sistemas encontrados, em 44 países, os autores analisaram um total de 130, sendo 69% pescarias artesanais. Os estudos de caso foram divididos por continente: Ásia (26%), Europa (21%), África (15%), América do Sul (14%), América do Norte e Caribe (17%) e Oceania (7%) e dos 18 casos na América do Sul, 8 são do Brasil. Ponderando que, para um manejo bem-sucedido das pescarias por meio de um co-manejo, os atributos mais importantes são a presença de lideranças comunitárias, cotas comunitárias ou individuais, coesão social e áreas protegidas de base comunitária.

Moura et al., (2009), são de acordo que o co-gerenciamento na pesca artesanal possui um enorme potencial como processo de participação, empoderamento, compartilhamento de poder, diálogo, gestão de conflitos e geração de conhecimento. E, apesar de diversos resultados positivos de co-manejo em pescarias mundiais, Castello (2008) considera que questões de participação e gestão pesqueira no Brasil continuam recebendo pouca atenção, quando comparados as questões biológicas e ecológicas dos estoques pesqueiros.

Monitoramento da pesca com o uso de aplicativos

A pesca artesanal, devido as suas características, apresenta complexidade para coleta de informações e monitoramento das atividades. Necessitando um dispêndio de recursos financeiros que poucos países têm para iniciar e, manter contínuo um sistema de coleta de dados (Vasconcellos et al., 2007). Além disso, a precariedade de informações torna o setor invisível e sem importância para os gestores, e o setor privado sem as informações necessárias para avaliar possíveis investimentos SAPOPEMA (2019a).

De acordo com Doria et al., (2019a), apesar do uso de aplicativos móveis ser bastante favorável na pesca de pequena escala, ainda é escasso, principalmente no Brasil. Devido ao desafio constante de realizar pesquisas com peixes migratórios na Bacia do Rio Amazonas, uma rede de cientistas e comunidades pesqueiras apostaram em uma nova abordagem para facilitar a obtenção de dados: uso de aplicativo de celular para o monitoramento. Liderado pela Wildlife Conservation Society (WCS), o projeto Ciência Cidadã para a Amazônia prioriza as 20 espécies de peixes migratórios mais abundantes no registro de desembarque pesqueiro, que garantem a segurança alimentar e são fontes de renda dos pescadores ribeirinhos e urbanos. Essas espécies circulam no Amazonas e seus afluentes em cinco países: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. Em parceiras com universidades, governos, ONGs, ribeirinhos e indígenas, estão sendo monitoradas a pesca de douradas (Brachyplatystoma flavicans), jaús (Paulicea luetkeni), surubins (Brachyplatystoma juruensi), piramutabas (Brachyplathystoma vaillantii), tambaquis (Colossoma macropomum), curimatãs (Prochilodus nigricans), jaraquis (Semaprochilodus teanurus) e matrinxãs (Brycon cephalus), utilizando uma abordagem participativa e tecnologias inovadoras e de baixo custo (InfoAmazonia, 2018).

As discussões para formular a proposta do Projeto Ciência Cidadã foram iniciadas em 2015 e, a partir de março de 2018, começaram as apresentações e articulações com os grupos participantes que optaram por fazer parte da etapa piloto, conhecendo e usando as ferramentas disponibilizadas pelo projeto. Entre maio e junho de 2018 ocorreram os primeiros testes e em julho, do mesmo ano, foi lançado o aplicativo. Até fevereiro de 2019, foram realizados 2.344 registros ao longo de 41 bacias hidrográficas (Doria et al., 2019a).

O Laboratório de Ornitologia da Universidade de Cornell (EUA) em colaboração com a Wildlife Conservation desenvolveu um aplicativo gratuito para dispositivos móveis, chamado Ictio, para obter informações visando a conservação da Amazônia, reduzindo drasticamente o custo de coleta dessas informações e capacitando os cidadãos como guardiões dos ecossistemas aquáticos (Ciencia Ciudadana para la Amazonía, 2019). A ferramenta digital registra com a colaboração das populações locais, pescadores individuais e organizados em associações, grupos de manejo, pescadores esportistas, cientistas, indígenas e qualquer cidadão que queira se registrar, observações de peixes capturados na Bacia Amazônica (Doria et al., 2019b).

A Ciencia Ciudadana para la Amazonía (2018), afirma ainda que, o aplicativo Ictio resultará em um banco de dados aberto que também compilará registros históricos de monitoramento local a partir de conjunto de dados existentes ou do uso de outras ferramentas, como fichas e questionários. Além disso, todas essas informações serão utilizadas para aprofundar a compreensão dos padrões de migração de peixes prioritários na Amazônia, com o objetivo de contribuir para o manejo sustentável da pesca e conservação dos ecossistemas aquáticos. No aplicativo, o usuário tem duas opções: escolher se está indo pescar, sendo possível georreferenciar todo o trajeto percorrido e ir alimentando com as capturas durante a pesca ou registrar peixes já capturados. Nas duas opções o pescador pode incluir fotos, ajudando a equipe de análise de dados a confirmar se realmente é a espécie indicada (InfoAmazonia, 2018). Em resumo, o Ictio permite registrar o número de indivíduos capturados, peso (kg)/peso total, localização da captura, preço de venda, data e fotografias. Por outro lado, os usuários podem ver e compartilhar seus dados, mantendo um registro das espécies que capturam ao longo do tempo.

A informação gerada poderá ser utilizada pela comunidade científica para ampliar o conhecimento sobre a ecologia dos peixes e sistemas aquáticos da Amazônia, por organizações da sociedade civil para ações de conservação e as populações locais terão acesso à informação para monitorar suas atividades de pesca e melhorar o manejo dos ecossistemas. Da mesma maneira, as informações poderão ser utilizadas pelo governo para melhorar as políticas sobre recursos pesqueiros, qualidade da água e gestão das bacias hidrográficas (Ciencia Ciudadana para la Amazonía, 2018). Para compreender que fatores ambientais influenciam a migração dos peixes, um monitoramento de parâmetros físicos-químicos da água e de dados meteorológicos complementa o trabalho de campo. O FieldKit, desenvolvido pela Conservify, é uma plataforma alimentada por energia solar, composta por um sistema modular de sensores de nível para coleta, armazenamento, visualização e compartilhamento de dados de pesquisa (InfoAmazonia, 2018).

Nas regiões do Médio e Alto Solimões, estado do Amazonas, foram mais de 30 treinamentos e reuniões para conhecer o Ictio. O Instituto Mamirauá, um dos parceiros do projeto tem realizado, desde julho de 2018, treinamentos nos municípios de Tefé, Alvarães, Uarini, Fonte Boa, Jutaí, Santo Antônio do Içá e Maraã (Mamirauá, 2018). Em abril de 2019, após um ano de trabalho com as comunidades utilizando o aplicativo Ictio, foi realizado o Encontro Ciência Cidadã em Tefé (AM). Na ocasião, foram discutidos temas como: a valorização do trabalho da pesca, o envolvimento de mais usuários e comunidades no projeto, melhorias nas tecnologias disponibilizadas, a importância do trabalho em conjunto dentro das comunidades pesqueiras, o uso e inserção das ferramentas no dia a dia das pessoas, além do envolvimento dos jovens no monitoramento dos peixes (Mamirauá, 2019).

O pesquisador Ronaldo Barthem, especialista em peixes da Amazônia, durante entrevista concedida ao InfoAmazonia em fevereiro de 2019, pondera que o sistema de Ciência Cidadã é uma excelente contribuição para produzir dados qualitativos, e o aplicativo Ictio é uma ferramenta de educação ambiental, causando uma interação entre as pessoas que trabalham com a pesca. E enfatiza a importância de fazer com que esses aplicativos se difundam para órgãos oficiais que trabalham com a gestão pesqueira, gerando dados mais confiáveis e consistentes para o manejo pesqueiro (InfoAmazonia, 2019).

Na Bacia do Rio Madeira (Rondônia), o aplicativo foi testado pela equipe da ECOPORÉ e do Laboratório de Ictiologia e Pesca da Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR), durante um ano – de julho de 2018 a julho de 2019 –. O monitoramento tinha como objetivo responder as perguntas das comunidades sobre a situação do pescado. Quando questionados, 97% dos pescadores que participaram do projeto, afirmaram que as informações geradas são importantes para comprovar a profissão, ter o balanço das pescarias e promover o monitoramento da ictiofauna. Do total de entrevistados, 80% demonstraram interesse em usar o Ictio. Algumas dificuldades foram relatadas, como para baixar o aplicativo e a preocupação de serem denunciados por continuarem a realizar a atividade pesqueira durante a época do defeso (SAPOPEMA, 2019b). Com o monitoramento, foi possível registrar 19 das 20 espécies prioritárias do projeto Ciência Cidadã e identificar as espécies que apareceram com maior frequência durante o ano de desenvolvimento do projeto (Doria et al., 2019a).

Um outro aplicativo para celulares, chamado Fisheye, foi criado pela iniciativa de um grupo formado por UNESP, Instituto Meros do Brasil, Fish Tv, Museu de História Natural Capão da Imbuia, Instituto Comar e a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. De acordo com o biólogo Lawrence Ikeda, que representa a Fish Tv no projeto, esses aplicativos são ferramentas importantes para o gerenciamento da atividade e incentivam os pescadores amadores e esportistas a participarem registrando suas capturas e solturas. O projeto incentiva a inserção do cidadão como colaborador e os dados gerados contribuem para avaliar a situação dos estoques e propor medidas de gestão (Mota, 2019).

No município de Feijó (Acre), distante 366 km da capital, Rio Branco, os pescadores começaram, em 2015, a usar o aplicativo de celular para monitorar 9 lagos do município. A iniciativa faz parte do projeto Pesca Sustentável da WWF em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e visa contribuir para a criação de um sistema formal de coleta de dados do pirarucu e da produção de pesca na região. O especialista de pesca do WWF-Brasil, Antônio Oviedo, explica que os aplicativos estão atualmente informatizando o que anteriormente era feito apenas em papel (Fulgêncio, 2015).

De acordo com a WWF (2015), foram desenvolvidos três aplicativos que funcionam no modo off-line para os pescadores coletarem os dados socioeconômicos da população local, informações sobre a produção da pesca, práticas ilegais e danos ao ecossistema. O primeiro aplicativo é o “Comunidade” e faz um mapeamento socioeconômico de todos que vivem da pesca no local. Com o “Observatório” é possível coletar dados sobre práticas ilegais de pesca, mortalidade de peixes, danos ao ecossistema, entre outros. O último e mais específico aplicativo é o Pesca+, o qual acompanha a produção pesqueira, inclui dados pessoais do pescador, número de usuários dos lagos, tipos de embarcações, artes de pesca utilizadas, tamanho e peso dos peixes capturados. Todas essas informações são enviadas a um banco de dados e uma vez ao mês, ocorre uma reunião na sede da Colônia de Pescadores e Aquicultores de Feijó para analisar os registros realizados. Através do monitoramento, foi possível estabelecer cotas de captura, artes de pesca e períodos permitidos para a atividade, e números de embarcações autorizadas para estarem pescando simultaneamente nos lagos, garantindo a sustentabilidade do pirarucu e de outras espécies.

Para Doria et al., (2019b), o uso de aplicativos para coleta de dados demonstrou ser uma ferramenta útil capaz de gerar informações sobre as pescarias de pequena escala, permitindo também a maior participação dos pescadores na articulação em redes e na busca de alternativas para a gestão pesqueira. Nesse contexto, o uso da tecnologia traz métodos inovadores de conservação e dinamiza o processo de monitoramento (WWF, 2015).

O comércio justo (fair trade) como uma oportunidade para os pescadores artesanais

Iniciado durante a década de 1960 em alguns países da Europa, a partir de ação de organizações, o comércio justo ou fair trade tem o objetivo de ajudar a diminuir as dificuldades encontradas pelos produtores e superar as desigualdades comerciais, criando um modelo comercial mais justo e equitativo. Gerando oportunidades de acesso aos mercados, as organizações passaram a debater e organizar alternativas comerciais para os pequenos produtores (Hillesheim, 2012).

Martinsí et al., (2013), dissertam que o fair trade é uma modalidade de comércio internacional e movimento social que resulta em sistemas mais justos e remuneração, através do estabelecimento de preços justos e menor disparidade social nas cadeias produtivas e acarreta melhores condições aos pequenos trabalhadores de países em desenvolvimento. O programa capacita agricultores, pescadores e trabalhadores para combater a pobreza, de forma a melhorar vidas e proteger o meio ambiente. No lugar de criar dependência em relação à ajuda, aproveita o poder dos mercados para ajudar produtores, empresas e consumidores a investir em um mundo melhor (FTUSA, 2017).

O marco inicial do Comércio Justo, no Brasil, foi um projeto experimental da Fairtrade Labelling Organization (FLO) com a experiência do Suco Justo, envolvendo produtores de laranja de Paranavaí/PR (Martins e Unterstell, 2009). O projeto que consiste em viabilizar a comercialização do suco de laranja para a Alemanha, Áustria e Suíça, tem a parceria do governo municipal e é monitorado por uma consultoria que faz o elo entre produtores e o mercado consumidor. Além de fornecer um produto de qualidade, o Suco Justo possibilitou melhorias sociais e regularização de trabalho dos produtores, que é um dos requisitos para a obtenção do selo concedido pela FLO. O café também é destacado no Brasil, com Associações em Rondônia e Espírito Santo já no mercado através da FLO (Schweickert, 2004).

Costa (2017), divulga que, apesar de ser pouco conhecida no Brasil, a certificação Fairtrade, funciona como um diferencial para aumentar a competitividade e nortear as escolhas dos consumidores. A pesquisa complementa que no país há 75 organizações certificadas, todas associações e cooperativas de produtos, que vendem com o selo de comércio justo frutas frescas a café. No entanto, ainda não há no Brasil pescarias com certificação Fairtrade. O comércio justo é reconhecido no Brasil pelo Sistema Nacional de Comércio Justo e Solidário (SNCJS), por meio do Decreto nº 7.358, de 17 de novembro de 2010 (Brasil, 2010). O SNCJS é um documento que mescla mecanismos de regulamentações e de fomento, no entanto pretende-se que se consolide como política pública, através de uma lei que o institucionalize (Farias et al., 2016).

De acordo com Oliveira et al., (2014), quando um consumidor adquire um produto resultante do comércio justo, ele está contribuindo para que sejam proporcionados alguns benefícios que garantam melhores condições de vidas em comunidades e que o produto não é derivado de um trabalho injusto. Toledo (2018) complementa que o fair trade surge como uma forma de “premiar” os pequenos produtores que adotam práticas sustentáveis, levando em consideração as questões sociais econômicas e ambientais, conhecido por tripé da sustentabilidade. Dessa forma, ao gerar oportunidade aos pequenos produtores, que se encontram em desvantagem pelo sistema convencional de comércio, o fair trade reduz as desigualdades que caracterizam o mercado global (Stelzer e Silva, 2019).

O modelo de Comércio Justo requer que as pescarias certificadas façam um aporte a partir da venda de seus produtos a um Fundo de Desenvolvimento Comunitário, que volte aos pescadores para ser administrado de forma coletiva. Conforme FTUSA (2020), o Prêmio do Comércio Justo não pode ser usado para despesas correntes, como pagamento de eletricidade, de salários e nem para pagar a certificação. Este deve ser utilizado para melhorar a qualidade de vida do pescador e toda a comunidade através de projetos sociais, econômicos e ambientais.

Schweickert (2004), defende que para um comércio justo e ético, é necessária a construção coletiva de um sistema, com uma regulamentação transparente que inclua os excluídos, políticas públicas adequadas, certificações independentes, planejamento que vise as relações comerciais, preservação ambiental e capital social e contribui, assim, para o desenvolvimento sustentável por meio de melhores condições aos trabalhadores.

A Fair Trade Certified USA (FTUSA) é uma organização sem fins lucrativos que fornece à indústria e aos consumidores, peixes e frutos do mar capturados em ambientes naturais, considerando critérios sociais, econômicos e ambientais. O Programa de Pesca foi lançado em 2014, principalmente para a pesca de pequena escala nos países em desenvolvimento, com a elaboração da Norma de Pesca de Captura (CFS) baseada nos princípios centrais da organização: (i) Empoderamento: A CFS ajuda os pescadores a desenvolver as habilidades necessárias para negociar efetivamente seu produto, (ii) Desenvolvimento econômico: Visando melhorar a estabilidade da renda dos pescadores, garantindo uma transparência na relação comercial com seus compradores e exigindo o pagamento de um Prêmio do Comércio Justo em todas as vendas de produtos com o selo Fair Trade Certified™, (iii) Responsabilidade social: protegendo os direitos humanos dos envolvidos com a pesca. São estabelecidas medidas de saúde e segurança para evitar lesões relacionadas ao trabalho. (iv) Gestão ambiental: os pescadores registrados deverão adotar práticas de pesca responsáveis e trabalhar para proteger os recursos pesqueiros e a biodiversidade, incluindo a coleta de dados e monitoramento para fornecer melhores informações sobre os estoques pesqueiros (FTUSA, 2017).

A Norma de Pesca de Captura CFS está organizada, de acordo com FTUSA (2018), em seis pilares (Figura 1) que abordam diferentes aspectos da gestão da pesca, do processamento e das instalações, e da administração dos grupos. A certificação abrange as frotas de pequena e média escala, locais de desembarque e plantas de processamento antes da exportação, envolvendo pescadores, processadores, compradores e consumidores. O cumprimento das normas é verificado, anualmente, durante auditorias presenciais e a certificação está sujeita também a uma rastreabilidade do produto, desde a captura até o consumidor final (FTUSA, 2020).

F

Conforme FTUSA (2020), a primeira pescaria certificada, em 2014, foi o Yellowfin Tuna na Indonésia. Em 2016, foi certificada a cadeia de suprimentos mexicana do Pacific Shrimp em Sinaloa e em seguida, o programa se expandiu e incluiu o Yellowfin Tuna das Maldivas. No ano seguinte, em 2017, o Skipjack Tuna nas Maldivas, as Atlantic Sea Scallop nos EUA e Salmon do Alasca também foram certificados. Outras pescarias como o Yellowfin Tuna e Skipjack Tuna (Ilhas Salomão), Yellowfin Tuna, Bigeye Tuna, Mahi Mahi e Swordfish (Moçambique), Chilean Balone (Chile), American Lobster (EUA), Ocean Whitefish, Barred Sand Bass, Vermillion Rock Fish (México), foram certificadas nos anos de 2018, 2019 e 2020. Atualmente, existem 11 sistemas de captura certificadas por Fair Trade USA e 1 de aquicultura (Figura 2).

F

FTUSA (2018), listou alguns benefícios obtidos contra quatro pilares do comércio justo, com as pescarias certificadas no período de 2014 a 2018:

CONCLUSÃO

Devido à grande importância econômica e social da pesca artesanal no Ceará, e levando em consideração que muitos estoques estão sobre-pescados, é urgente a necessidade de buscar inovações e implementar estratégias sustentáveis que impulsionem o desenvolvimento de todo o setor.

A ausência de um programa contínuo de estatística pesqueira no Brasil, resulta em uma precariedade de informações, a qual dificulta o avanço de pesquisas e propostas para a formulação de políticas públicas. O extinto Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA) publicou dados estatísticos até o ano de 2011, e, atualmente, existem poucas iniciativas que são pontuais e não se tornam políticas efetivas.

A gestão compartilhada entre governo e usuários, através da organização de comunidades pesqueiras para um co-manejo, incentiva a pesca responsável e resulta em melhorias na gestão através do conhecimento local. Por outro lado, a implementação de um plano de monitoramento das pescarias com o uso de aplicativos, tecnologia inovadora e de baixo custo, gera dados que podem ser utilizados como subsídios para a tomada de decisão, e podem suprir as lacunas de informações. Estas duas inovações, somadas ao desenvolvimento de um comércio justo, que cria oportunidades de mercados levando em consideração as questões sociais, econômicas e ambientais, trazendo uma remuneração justa aos pescadores, mostram-se como instrumentos eficazes que podem ser aplicados nas comunidades do Estado do Ceará para melhorar a qualidade de vida dos pescadores artesanais.

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Recebido: 12 jun. 2021

Aprovado: 28 out. 2021

DOI: 10.20985/1980-5160.2021.v16n3.1650

Como citar: Vidigal, R.C.A.B., Eloy, H.R.F., Catter, K.M., Souza, R.L.M., Lisboa, V., Matias, J.F.N., Cruz, A.M. (2021). Inovações para a pesca artesanal: subsídios para o desenvolvimento da atividade no estado do Ceará. Revista S&G 16, 3. https://revistasg.emnuvens.com.br/sg/article/view/1650