Análise comparativa de custos financeiros e impactos ambientais dos sistemas de distribuição de água fria coletivo e individual

Henrique Serrano Moreira

enghenriqueserrano@gmail.com

Universidade Federal Fluminense – UFF, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil.

Ana Lucia Torres Seroa da Motta

anaseroa@gmail.com

Universidade Federal Fluminense – UFF, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil.


RESUMO

Desenvolvimento sustentável é um conceito essencial para empresas, governos e pessoas, atualmente. A construção civil é um dos maiores setores econômicos do mundo e afeta diretamente a natureza. Sendo assim, é importante entender como a construção civil e o desenvolvimento sustentável interagem. Este trabalho visa analisar esta interação através de um estudo de viabilidade comparativo entre sistemas de distribuição de água fria coletiva ou individualizada em empreendimentos. O objetivo principal é descobrir um modelo que otimize os custos ambientais com os custos financeiros, algo que não foi muito explorado na literatura. O método utilizado para alcançar o objetivo é um estudo de caso realizado com prédios do bairro de Icaraí, na cidade de Niterói/RJ. Primeiro, para estudar o impacto ambiental, realiza-se a Análise do Ciclo de Vida dos tubos de policloreto de vinila (PVC) utilizados na instalação de cada tipo de distribuição. Depois, através de simulações com base no software TCPO e dados reais de consumo de água em prédios, realiza-se a análise financeira de cada tipo de distribuição. É possível concluir que o sistema de distribuição coletivo, em geral, é mais barato na instalação e uso. Porém, o impacto ambiental gerado pelo uso de PVC neste tipo de distribuição é maior. Portanto, o engenheiro está sujeito a um trade-off entre desenvolvimento sustentável e custos financeiros ao escolher qual distribuição implantar. Contudo, para o caso de empreendimentos de classe média, os resultados são mais claros e sugerem que a distribuição individual é mais eficiente, tanto em termos financeiros quanto ambientais.

Palavras-chave: desenvolvimento sustentável; construção civil; sistemas de distribuição de água; impacto ambiental.


INTRODUÇÃO

A forma como a sociedade vem conduzindo seu desenvolvimento está causando a degradação dos ecossistemas e a exaustão dos recursos naturais. Adhya et al. (2010) apontam que o mundo moderno consome cada vez mais recursos, produz mais poluentes, além de buscar mais espaço e energia. Por outro lado, o mundo tem passado por mais desastres naturais do que há algumas décadas. Estes desastres são resultado das demandas crescentes do mercado; porém, a sociedade naturalmente quer proteção contra estes desastres. Então, há uma clara contradição entre o modelo de desenvolvimento e o anseio por um meio ambiente saudável.

A busca por mais espaço está particularmente relacionada com a construção civil, que é o setor responsável por atender esta demanda. As construções afetam a natureza de diversas maneiras, tanto durante o processo da construção, que é a utilização de muita energia, devastação de florestas ou mudança no curso de rios, quanto depois do projeto estar concluído, pois se o projeto não for feito de maneira eficiente, os prédios podem gastar mais água ou energia elétrica do que o necessário, por exemplo.

Há, portanto, uma relação direta entre construção civil e a degradação do meio ambiente, que deve ser estudada. Neste contexto existe um conceito importante de ser tratado, que é o desenvolvimento sustentável. Existem diversas definições para desenvolvimento sustentável, mas de uma maneira geral, o conceito sugere que o desenvolvimento deve conciliar o crescimento econômico com a redução dos impactos ambientais.

Este trabalho explorará o conceito de desenvolvimento sustentável do ponto de vista da conciliação da construção de um prédio com a redução do impacto ambiental e dos custos financeiros envolvidos neste processo.

Particularmente, este artigo utiliza dados de instalação e de utilização de sistemas de distribuição de água fria individual e coletiva, em diferentes tipos de prédios, e testa qual dos dois tipos é mais eficiente em termos financeiros, além de termos ambientais.

O estudo de caso utiliza a técnica de Análise de Ciclo de Vida (ACV), tomando tubos de policloreto de vinila (PVC) como base, para estimar os impactos ambientais de cada tipo de distribuição de água. Também se estuda qual das distribuições está relacionada a um maior consumo de água após o prédio estar construído. Para a análise financeira utiliza-se o programa TCPO para calcular qual o custo de instalação de cada distribuição e dados reais de consumo de água em prédios, para ver qual distribuição gera mais gasto depois, em Niterói/RJ.

Essa abordagem é importante na prática, pois as empresas buscam, em última instância, lucro. Então, não adianta encontrar o meio mais sustentável de construir um prédio se as empresas não terão condições de investir nesta construção. É preciso estudar como fazer essa conciliação.

Além desta introdução, o artigo possui mais quatro seções. A primeira seção faz uma breve revisão bibliográfica sobre o tema estudado. A segunda descreve e apresenta a ACV para o PVC na construção dos prédios. A terceira foca nos cálculos financeiros de cada tipo de distribuição. Por fim, a última seção apresenta as considerações finais do estudo.

REVISÃO DA LITERATURA

A literatura relacionada a impactos ambientais e financeiros é grande, porém não apresenta um consenso. Os resultados não apontam se as práticas de desenvolvimento sustentáveis são compatíveis com finanças mais saudáveis ou não. Alberton (2003), por exemplo, analisa as finanças no período anterior e posterior à certificação NBR ISSO 140001:96 de empresas. No resultado geral, a certificação parece ajudar em diversos indicadores financeiros, mas não em todos.

Já a literatura comparada a custos ambientais de métodos de distribuição de água fria é pequena. Esta é, inclusive, uma das motivações para a confecção deste estudo.

Na literatura internacional é difícil encontrar artigos que tratem sobre o tema. Um estudo que se relaciona marginalmente com este artigo é o de Arbués e Barberan (2004). Os autores não tratam sobre o tipo de distribuição (coletiva ou individual), porém abordam os impactos de mudanças no preço exercido sobre a demanda de água em prédios. Os autores encontraram que o preço é razoavelmente efetivo para controlar a demanda de água. Em outras palavras, caso o preço da água suba, a demanda reduz de forma razoável.

É possível traçar um paralelo entre este resultado e o presente estudo. Ao descobrir qual sistema de distribuição é mais eficiente em termos financeiros, ou seja, qual é o mais barato para o cliente/morador, pode-se inferir que este sistema geraria uma maior demanda de água. Isto é, um custo mais barato de água pode ser interpretado como uma redução de preço relativo, o que estimularia o maior consumo de água, de acordo com Arbués e Barberan (2004).

Por isso, é importante considerar este efeito em nossa análise. Isto porque a análise é feita tanto na dimensão de redução de impacto ambiental, quanto na redução de custo financeiro na construção. Mas, se essa redução de custo fizer os moradores consumirem mais, a redução no impacto ambiental pode ser menor do que a esperada.

Em termos de literatura nacional, existem alguns estudos específicos analisando distribuição coletiva e individual de água. O estudo de Matos (2003) faz uma boa descrição sobre o processo de implantação de distribuição individual de água em prédios. O texto aborda diversas dimensões da implantação, desde o envolvimento do cliente até os desafios para a mudança de sistema. O artigo ainda faz uma revisão sobre a legislação vigente e destaca que existem deficiências na regulação da água.

Carvalho (2010) apresenta uma perspectiva que pode amenizar o possível efeito negativo do resultado de Arbués e Barberan (2004). Carvalho (2010) destaca que a medição individual em edifícios pode levar a uma redução no consumo. Além disso, o discute sobre as soluções disponíveis para implantar o sistema individualizado. Assim como Matos (2003), Carvalho também apresenta um panorama sobre as leis que regulamentam a distribuição de água no Brasil.

Sobre a ACV, especificamente do PVC (que também é o objeto de estudo aqui), há o trabalho de Lima (2007) que faz uma descrição detalhada do inventário do PVC. Sua pesquisa mostra os impactos ambientais dos tubos de PVC desde a fabricação da resina até o descarte do tubo após o uso. Este estudo servirá de base para a ACV feita aqui.

Outro artigo importante é o de Junqueira (2005), cujo estudo é parecido com o proposto aqui. O autor estudou um edifício que trocou o sistema de distribuição coletiva para individual. A diferença é que, aqui, nossos resultados serão simulados e mais detalhados. Contudo, os resultados encontrados por Junqueira (2005) podem servir como base de comparação. A conclusão principal do autor é que o investimento na troca para o sistema individualizado tem seu payback rapidamente (um mês após a implantação) e que há redução no consumo de água e no impacto ambiental.

É importante destacar que muitos dos estudos citados são dissertações de pós-graduação, mas poucos trabalhos foram efetivamente publicados. Portanto, além de contribuir no ponto específico de uma análise de custo benefício entre sustentabilidade e custo financeiro, no caso de sistemas de distribuição de água, este artigo também busca consolidar alguns dos temas tratados nestes trabalhos não publicados.

ANÁLISE DO IMPACTO AMBIENTAL E CUSTOS FINANCEIROS

A pesquisa visa conciliar à ACV com uma análise de custo financeiro, no caso de instalação e uso de distribuição de água coletiva ou individual em edifícios residenciais. Como amostral, utilizamos projetos de edifícios da cidade de Niterói/RJ. Na parte da ACV tomamos como objeto de pesquisa os tubos de PVC e calculamos quanto de impacto ambiental é gerado de acordo com os diferentes projetos – prédios de classe baixa/média, média e média alta, divididos em distribuição coletiva e individual. Lembrando que a Lei nº 13.312, de 12 de julho de 2016, torna obrigatória a medição individualizada.

Para os cálculos dos custos financeiros utilizou-se o software TCPO para estimar o custo de instalação de sistema de água fria coletivo e individual nos três diferentes tipos de empreendimento. Além do custo de instalação, simulou-se o custo de uso utilizando uma base de consumo de água, que foi fornecida por uma administradora de prédios de Niterói/RJ, em seis diferentes prédios. Objetivou-se responder as seguintes indagações abaixo:

Qual dos dois tipos de sistemas tem um menor custo de instalação?

Qual dos dois sistemas tem um menor custo de operação?

Qual dos dois sistemas consome maior quantidade de material, logo, gera mais resíduos?

Qual dos dois tipos de sistema gera menor consumo de água ao longo de sua vida útil?

ANÁLISE DO CICLO DE VIDA

A ACV é uma técnica para a “compilação e avaliação das entradas, das saídas e dos impactos ambientais potenciais de um sistema de produto ao longo de seu ciclo de vida” (ABNT, 2009). O ciclo de vida de um produto inclui a extração das matérias-primas, passando por seu transporte, processamento, distribuição, uso, manutenção e descarte pós-uso.

O resultado do ACV é a identificação de forma quantitativa e sistemática dos fluxos de entrada e saída de material, energia, resíduos e outras emissões produzidas durante todo fluxo de vida, tornando possível a estimativa do impacto ambiental de determinado produto.

Nesse estudo, a metodologia do ACV foi utilizada em conformidade com os documentos normativos ISO 14040 e ISO 14044. As etapas são mostradas na Figura 1 e se dividem em quatro principais: definição de objetivo e do escopo, análise de Inventário do Ciclo de Vida (ICV), avaliação de Impacto do Ciclo de Vida (AICV), e interpretação, conforme figura abaixo.

Figura 1. Estrutura da Análise do Ciclo de Vida

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Fonte: Espitia et al. (2015)

OBJETIVO DA ANÁLISE DE CICLO DE VIDA

O objetivo principal da ACV é mensurar os potenciais impactos ambientais do ciclo de vida entre dois sistemas de distribuição de água fria (coletivo x individual) em empreendimentos residenciais. Consequentemente, também podemos mensurar os custos envolvidos em cada tipo de distribuição e discutir qual fornece o melhor custo-benefício em termos ambientais e financeiros.

O estudo envolveu a análise de três empreendimentos (projetos) de tipologias distintas, conforme descriminadas a seguir:

Edificação multifamiliar de alta renda, caracterizado em: quatro unidades de 250m2 por pavimento (totalizando 52), quatro elevadores e quatro suítes em cada apartamento.

Edificação multifamiliar de renda média, caracterizado em: oito unidades de 135m2 por pavimento (totalizando 102), quatro elevadores, e cada apartamento com três quartos (sendo uma suíte).

Edificação multifamiliar de média/baixa renda com: onze unidades de 74m2 por pavimento (totalizando 114), quatro elevadores, e cada apartamento com três quartos (sendo uma suíte).

Para a elaboração deste estudo foram utilizados os projetos originais com distribuição individual e paralelamente foram desenvolvidos novos projetos de distribuição coletiva. O estudo foi conduzido levando em conta as normas NBR5648:1997 – “Sistemas prediais de água fria” e NBR5626:1998 – “Instalação predial de água fria”.

Os resultados obtidos podem ser utilizados no debate sobre sustentabilidade dentro da indústria da construção civil. Além disso, pretende-se contribuir para a difusão desta ferramenta, servindo de base para processos decisórios na escolha de opções de diversos projetos.

ANÁLISE DO PROJETO

Para a análise do projeto foram selecionadas três diferentes tipologias de três prédios residenciais: um de classe A, média/alta (52 unidades de 250 m2); um de classe B, média (102 unidades de 135 m2); e um com tipologia de classe C, média/baixa (114 unidades de 74m2).

Em todos os projetos obtidos com as construtoras, as instalações hidráulicas eram de distribuição individual, conforme a Lei nº 13.312, de 12 de julho de 2016, que obriga a medição individualizada do consumo hídrico nas novas edificações condominiais. Todos os projetos foram analisados no software Autocad, no qual foi possível levantar o quantitativo linear das tubulações com diferentes diâmetros e o número de conexões em cada uma delas.

Através da planta baixa foi possível levantar todo o quantitativo horizontal e com os cortes foi possível levantar o quantitativo vertical. Ambos expressos nas três tabelas: 1.1, 1.2 e 1.3. Também foi viável analisar como a qualidade do projeto de arquitetura contribui para a redução de gastos com materiais

Algumas informações do projeto de distribuição individual foram parametrizadas para a comparação com a distribuição coletiva, como as alturas das louças e metais, espessura de laje e pé direito, fazendo com que algumas distorções entre os dois projetos fossem minimizadas.

Para o projeto de distribuições coletivas foi criado um novo projeto levando em conta algumas variáveis já parametrizadas no projeto de distribuição individual, indicadas nas observações das tabelas 1.1, 1.2 e 1.3, além da consulta à NBR 5626 – “Instalação predial de água fria” e Creder (6a Edição/2006).

O projeto de instalações coletivas também foi desenvolvido no software Autocad, bem como os projetos originais. Foram levantados do arquivo os quantitativos que também estão indicados nas Tabelas 1.1, 1.2 e 1.3. Com as quantidades de cada material foi possível utilizar o software TCPO para chegar ao custo de cada um dos dois diferentes sistemas em cada uma das três tipologias, bem como o consumo de PVC em cada uma das opções de projeto, o que tornou possível traçar um quadro comparativo entre eles.

Tabela 1.1. Classe A - Cálculo do custo de instalação e quantidade de material utilizado para o empreendimento

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Tabela 1.2. Classe B - Cálculo do custo de instalação e quantidade de material utilizado para o empreendimento

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Tabela 1.3. Classe C - Cálculo do custo de instalação e quantidade de material utilizado para o empreendimento

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ESCOPO

Sistema de produto

O sistema do produto define como é o ciclo de vida do produto analisado. Para este estudo foi considerado um sistema similar ao da Figura 2.

Figura 2. Sistema de produto do ACV

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Fonte: Epitia, Gondak e Silva (2015)

Segundo Espitia et al. (2015), “o sistema de produto possui seis processos elementares: obtenção de matérias-primas, transporte das matérias-primas, manufatura, distribuição do produto, uso (transporte do produto utilizado), e pós-uso (disposição final, reciclagem)”.

Os dados primários foram obtidos com a empresa Tigre/SA, fabricante dos tubos de PVC e os dados referentes à consumo foram fornecidos por uma administradora de prédios em Icaraí (prédios foram selecionados visando adequar a tipologia do estudo: classe alta, média e baixa). Dados referentes ao inventário de extração, transporte e manufatura foram obtidos de Lima (2007). A inclusão de custo da mão de obra foi feita do programa TCPO.

Unidade funcional, fluxo de referência e fronteira do sistema

Para analisar o impacto dos diferentes tipos de distribuição de água, consideramos a quantidade de tubos de PVC (com diferentes tamanhos) utilizada. O tubo de PVC serve, no escopo deste estudo, para armazenar e transportar água em edifícios residenciais. Quanto à unidade funcional, esta foi definida como o consumo de água por habitante. Já o fluxo de referência para a unidade funcional descrita foi a manufatura de um 1kg de tubulação de PVC.

A fronteira do sistema foi estabelecida inicialmente através da função do produto e da escolha do material utilizado, que foi o PVC. Conforme Lima (2007), não foi considerado o impacto direto da utilização dos tubos, mas sim o impacto do descarte pós-consumo. Ainda de acordo com Lima (2007), os autores Darbello (2008) e Matos (2003) consideram que apenas 9% dos tubos vão para a reciclagem após uso, já o restante vai para aterros sanitários.

Inventário de Ciclo de Vida (ICV)

Definido o sistema de produto, unidade funcional e fluxo de referência, o próximo passo envolveu a coleta de dados e os procedimentos de cálculo para quantificar as entradas e as saídas do sistema de produto. Assim, foram quantificados os consumos de recursos materiais, energéticos e as emissões ao ar, água e solo associados ao sistema, sendo esta a etapa de ICV. De forma a simplificar a análise, o foco será nas saídas do sistema, isto é, a concentração será no impacto ambiental.

Para organizar o estudo, o sistema de produto foi subdividido em cinco processos singulares e, com isso, foram delimitados os subsistemas, como: (i) fabricação da resina; (ii) transporte da resina; (iii) fabricação dos tubos; (iv) transporte dos tubos para lojas; (v) transporte dos tubos para descarte. Note que a fase de utilização não foi incluída por falta de dados. A base de dados utilizada foi a de Lima (2007), que por sua vez baseou-se nos estudos e nos dados coletados por Borges (2004).

Fabricação da resina PVC

A fabricação da resina gera diversas entradas e saídas, portanto, para simplificar o estudo focamos nas saídas de gás carbônico fóssil, mas não no fóssil e enxofre. Segundo os estudos citados acima, o impacto gerado pela fabricação de resina para cada quantidade de PVC (ver Tabela 2 para as quantidades de cada tipo de empreendimento) é:

Tabela 2. Saídas tóxicas da fabricação de resina por distribuição coletiva ou individual e por tipo de empreendimento (kg/quantidade total de PVC)

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Fonte: Elaboração própria com base em Lima (2007)

Esta etapa (como poderá ser constatado posteriormente) é uma das que mais impacta o ambiente em termos de gases tóxicos. Mesmo as fases de transporte, em que o diesel é muito utilizado, não chegam perto do impacto da fabricação de resina.

É possível reparar que os empreendimentos em que a distribuição coletiva é utilizada geram mais emissões de gases, por conta da maior necessidade de PVC, que é a resina.

TRANSPORTE DA RESINA

Lima (2007) considera o transporte da fábrica de resina Solvay até a fábrica da Tigre em Rio Claro (SP), totalizando 530 km. Contudo, eles consideram uma quantidade de 27 toneladas de resina. Para compatibilizar a análise, as saídas foram recalculadas para as quantidades de resina em cada caso.

Tabela 3. Impacto do transporte de resina por distribuição coletiva ou individual e por tipo de empreendimento (kg/quantidade total de PVC)

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Fonte: Elaboração Própria com base em Lima (2007)

FABRICAÇÃO DE TUBOS DE PVC

Na fabricação, Lima (2007) considerou as informações das empresas Tigre S.A, Absoluto Ltda. e dados do Ministério de Minas e Energia. Seguindo os autores, as proporções consideradas na fabricação foram de 82% de resina de PVC e 12% de carga de carbonato de cálcio (12%). A perda de água no resfriamento dos tubos não foi considerada. A Tabela 4 mostra a quantidade de calor gerada em cada caso.

Tabela 4. Impacto da fabricação de tubos de PVC por distribuição coletiva ou individual e por tipo de empreendimento (kg/quantidade total de PVC)

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Fonte: Elaboração Própria com base em Lima (2007)

Mais uma vez a distribuição coletiva está associada à mais impacto ambiental, sugerindo que ela é pior em termos de desenvolvimento sustentável.

TRANSPORTE DE PVC

Lima (2007) considerou o transporte de 11,4 toneladas para uma distância de 100 km desde a fábrica em Rio Claro/SP. Neste trabalho recalculamos os pesos em cada tipo de empreendimento e utilizamos 600 km de distância, pois esta é a quilometragem aproximada da fábrica até Niterói/RJ.

Tabela 5. Impacto do transporte por distribuição coletiva ou individual e por tipo de empreendimento (kg/quantidade total de PVC)

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Fonte: Elaboração Própria com base em Lima (2007)

Os resultados novamente indicam que a distribuição coletiva emite mais gases tóxicos e outras substâncias nocivas para o meio-ambiente.

Transporte para o descarte

Para o descarte, recalculamos os pesos fornecidos em Lima (2007) e colocamos a distância em 35 km, que é de Niterói até o aterro sanitário mais próximo, Jardim Gramacho.

Tabela 6. Impacto do transporte de tubos para o aterro sanitário (kg/quantidade total de PVC)

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Fonte: Elaboração Própria com base em Lima (2007)

Os resultados se repetem sugerindo que a distribuição de água coletiva gera mais impacto no meio ambiente em termos de quantidade de PVC utilizada em sua instalação.

Interpretação do inventário

Utilizando o programa TCPO foi possível calcular a quantidade (em quilogramas) de tubos de PVC utilizados em cada projeto, como prédios de classe média/baixa, média e média/alta, com distribuição coletiva ou individualizada. Estas quantidades são as que foram usadas para fazer os cálculos das saídas do ACV por tipo de distribuição e tipo de empreendimento. Estas quantidades estão na Tabela 7.

Tabela 7. Quantidade (kg) de tubo de PVC gasta em cada tipo de distribuição e empreendimento.

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Fonte: Elaboração própria com dados do software TCPO e de projetos estudados

Comparando por tipos de empreendimento, vemos que a quantidade de PVC exigida para montar a distribuição coletiva é maior do que para a individual em todos os casos. Este é o motivo de todas as contas da ACV terem apontado para a distribuição coletiva, se mais prejudicial para o meio-ambiente em termos de saídas tóxicas.

O caso mais marcante é para o prédio de classe média, onde a distribuição coletiva utiliza 22% de PVC a mais do que no caso individual. Para os empreendimentos de classe média/baixa e média alta, a diferença é de apenas 3,5% e 2,2%, respectivamente.

Isto implica que a distribuição coletiva gera gás carbônico e enxofre na produção de resina, mais calor na produção de tubos e mais componentes como amônia, benzeno, material particulado, entre outros, em todos os períodos de transporte.

É interessante perceber que não há uma relação linear entre a quantidade de unidades e a diferença na quantidade de PVC necessária por distribuição. A quantidade de apartamentos é decrescente com relação ao aumento da classe, enquanto a diferença de quantidade de PVC para distribuição coletiva é de, respectivamente, com o aumento da classe: 3,5%, 22% e 2,2%. Esta constatação é importante por mostrar que cada projetista deve fazer seus cálculos e não considerar que o aumento de unidades necessariamente aumenta a quantidade de PVC e, portanto, o impacto ambiental.

O resultado que aponta que a distribuição coletiva gasta mais tubos de PVC é um pouco surpreendente do ponto de vista do senso comum. Uma pessoa poderia pensar que um sistema que distribui a água diretamente de forma individual gastaria mais material (PVC) do que um sistema central. Contudo, os números mostram que este não é o caso.

Tendo em vista esse resultado, sob a perspectiva da análise de impacto ambiental, a distribuição de água coletiva é pior do que a individual. Isto é, ao instalar a distribuição coletiva de água fria gera-se mais resíduos tóxicos para o meio-ambiente.

Ademais, na parte da análise financeira será avaliado se algum dos tipos de distribuição induz mais consumo de água, o que seria prejudicial ao meio-ambiente. Esse fato deve ser levado em conta.

Vale destacar que a comparação entre os três tipos de empreendimento não pode ser feita. Isto porque os tamanhos das unidades e a quantidade de pavimentos não é a mesma para todos os prédios.

Em termos gerais, também é interessante notar que apesar de o transporte estar presente em diversas fases, seu impacto não é muito significativo. A emissão de gás carbônico, por exemplo, acumulada em todos os transportes é de 0.005024, mas isto é apenas aproximadamente 1% do que é gerado na fabricação da resina.

ANÁLISE FINANCEIRA

O diferencial do presente estudo é considerar não apenas o impacto ambiental, mas também os custos envolvidos em cada tipo de distribuição de água. Para isso, primeiro foi analisado o custo de instalação de cada um dos tipos e depois o custo de uso de cada um.

Na parte da instalação, além dos custos dos tubos de PVC, também foram considerados: furo em concreto com broca de widia, utilização do martele elétrico Ø 1 1/2" com profundidade 15 cm, hidrômetro multijato para medição em entrada de água residencial Ø 1" com vazão 5 m³/h, registro de gaveta bruto Ø 25 mm - 1", registro de gaveta bruto Ø 32 mm - 1 1/4", válvula redutora de pressão Ø 50 mm - 2" e custos com mão de obra. Os detalhes dos cálculos estão apresentados no apêndice deste estudo.

A Tabela 8 apresenta os custos de instalação de cada tipo de distribuição (coletiva e individual) e para cada tipo de empreendimento (classe A, B e C).

Tabela 8. Custos de instalação de distribuição coletiva e individual em cada tipo de empreendimento e % em relação aos custos da instalação coletiva.

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Fonte: Elaboração própria com dados do software TCPO e de projetos estudados

Para cada tipo de empreendimento o custo está separado em custo total de instalação da distribuição (que inclui insumos e mão de obra) e custo somente da mão de obra. Para os empreendimentos de A e C, tanto os custos com mão de obra quanto o custo total são mais caros no caso da distribuição individual. Por outro lado, no caso do empreendimento B, os custos são mais baratos para o caso da distribuição individual. Aqui é possível perceber um trade-off ao qual o projetista está sujeito: em geral, o sistema individual custa mais em termos financeiros, mas afeta menos o meio ambiente.

Contudo, apenas com base nos custos de instalação não é possível dizer qual tipo de distribuição é mais vantajosa em termos financeiros. Isto porque nos casos dos edifícios A e B, por exemplo, a diferença é muito pequena (se comparada aos custos totais de uma construção de prédio), o que sugere que pequenas economias ao longo do tempo podem significar uma mudança na escolha do sistema mais barato. Mesmo no caso do empreendimento C, a diferença não parece ser muito alta. Portanto, é necessário analisar como os custos se comportam ao longo do tempo em cada caso.

Para fazer esta análise da dinâmica do consumo de água em cada tipo de distribuição e o respectivo custo, foram coletados dados durante 21 meses de consumo em seis empreendimentos diferentes da região central da cidade de Niterói (Icaraí, Ingá e Centro). Buscou-se respeitar as definições de classe média/baixa, média e média/alta, sempre que possível.

A estratégia de cálculo foi utilizar os valores reais de contas de água para calcular valores simulados referentes aos projetos estudados no programa TCPO. Especificamente, a partir da conta de água, calculamos quanto seria o consumo por habitante em cada tipo de empreendimento, depois multiplicou-se por 2,5 (média de habitantes segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE) e pelo número de unidades de cada projeto. Assim, foi possível fazer uso de todos os dados disponíveis e extrair o máximo de informação possível. Os resultados das médias dos 21 meses estão apresentados na Tabela 9.

Tabela 9. Custo e consumo médio de água mensal por habitante por mês de edifícios pesquisados

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Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela Lumarj (administradora de condomínios)

Os resultados referentes ao custo de instalação são corroborados: os prédios de classe A e C tem um custo mais alto quando a distribuição de água fria é feita de forma individual para cada unidade. Novamente, no caso da classe B, a distribuição coletiva é mais cara, o que torna mais vantajoso, financeiramente, a distribuição individual neste caso específico.

Como os resultados estão alinhados para instalação e uso, é possível analisar se há um ponto de break-even onde após um período de uso uma distribuição se tornaria mais vantajosa que a outra. Isto é, a distribuição coletiva tende a ser mais barata na instalação, porém a média mensal de consumo de água é maior.

Os custos financeiros possuem, claramente, relação direta com o consumo. Portanto, do ponto de vista ambiental, a distribuição coletiva impacta mais o meio ambiente do que a distribuição individual em termos de consumo de água (igualmente os impactos gerados pelo PVC).

Um ponto interessante possível de análise é em quantos meses o consumo de água ficou no limiar mínimo; isto é, os meses em que se pagou apenas a taxa mínima exigida pela distribuidora de água. A Tabela 10 mostra estes números.

Tabela 10. Quantidade de meses com consumo mínimo de água

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Fonte: Elaboração própria com dados fornecidos pela Lumarj (administradora de condomínios)

Existe uma clara relação entre a tipologia do empreendimento e o consumo de água. No caso da classe A, com a distribuição individual, não se consumiu o mínimo em nenhum mês; com a distribuição coletiva se consumiu o mínimo em um mês. Já no caso da classe B, a distribuição individual gerou consumo mínimo em nove dos 21 meses; e, para a distribuição coletiva, em dois meses. Para o edifício de classe C, com a distribuição individual, a conta de água ficou na taxa mínima em seis dos 21 meses analisados; com a distribuição individual foram cinco.

No geral, a distribuição individual parece gerar uma leve tendência ao consumo mínimo (dois dos três casos). Contudo, os resultados são muito próximos nos edifícios de classe A e C. Apenas no edifício de classe B é que essa diferença parece ser mais significativa.

CONCLUSÃO

A análise dos impactos ambientais foi feita através da ACV, de tubos de PVC para cada tipo de distribuição e para três tipos diferentes de empreendimento (Classe A, alta; Classe B, média/alta; Classe C, média/baixa). Utilizou-se projetos compatíveis com os tipos de empreendimento através de levantamentos quantitativos, por meio dos quais foi possível calcular as quantidades de tubos (em kg) utilizadas para cada tipo de distribuição.

Os resultados mostraram que a distribuição individual é, na maioria dos casos, melhor para o meio ambiente. Isto é, para realizar a instalação do sistema individual gasta-se menos quantidade de tubos de PVC, o que resulta em menor impacto ambiental.

A análise financeira foi feita com base no TCPO para a instalação com dados reais de consumo de empreendimentos com tipologias parecidas a de classe A, B e C . A partir do valor da conta se calculou o consumo por habitante e o gasto médio por metro cúbico de água.

Os resultados mostraram que a distribuição individual custa mais caro para instalar, apesar de gastar menos tubos, o que pode ser explicado por conta de outros materiais necessários para a instalação. Porém, a distribuição individual está relacionada à consumo menor, o que gera menores custos de conta de água. Este resultado é intuitivo, pois, em geral, espera-se saber exatamente quanto cada pessoa gastou. gerando a tendência de economizar.

Em linhas gerais, o estudo permite concluir que o engenheiro/projetista está sujeito a um trade-off, pois a distribuição coletiva gera um maior impacto ao meio ambiente, mas é mais barata em termos financeiros. Como as evidências não são indiscutíveis, a importância de levar em conta esta relação custo-benefício fica maior ainda.

Os resultados encontrados nesta pesquisa sugerem que fatores como a tipologia do empreendimento, número de andares, tamanho da laje, número de unidades por pavimento e pé direito influenciam nos resultados obtidos, não sendo possível identificar uma fórmula para determinar qual o sistema de menor impacto por tipo de empreendimento. Esse é um ponto para ser estudado em futuras pesquisas.

Entendemos também que a avaliação de projetos atualizados não abrange completamente as implicações da lei, uma vez que o custo para reforma de uma adequação em condomínios antigos pode inviabilizar trade-off, sendo mais um ponto de interesse para novos estudos.


REFERÊNCIAS

ABNT NBR ISO 14040:2006 (2009), Gestão Ambiental – Avaliação do Ciclo de Vida – Princípios e estrutura, Rio de Janeiro, ABNT.

ABNT NBR ISO 14044:2006 (2009), Gestão Ambiental – Avaliação do Ciclo de Vida – Requisitos e orientações, Rio de Janeiro, ABNT.

ABNT NBR 5648:1997 (1999), Sistemas prediais de água fria – Tubos e conexões de PVC 6,3, PN 750 kPa, com junta soldável – Requisitos, Rio de Janeiro, ABNT

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Recebido: 30 out. 2019

Aprovado: 16 dez. 2019

DOI: 10.20985/1980-5160.2019.v14n2.1587

Como citar: Moreira, H. S. (2019), “Análise comparativa de custos financeiros e impactos ambientais dos sistemas de distribuição de água fria coletivo e individual”, Sistemas & Gestão, Vol. 14, No. 2, disponível em: http://www.revistasg.uff.br/index.php/sg/article/view/1587 (acesso dia mês abreviado. ano).